Anna sabia desde cedo que seria um dia difícil, quando Sergei começou a se mexer pela casa, mudando cadeiras e conferindo se havia pratos suficientes.
Os parentes dele sempre chegavam em grupo: a irmã Larisa com o marido Volodia, a tia Klava, o primo Igor com a esposa.

E toda vez Anna se sentia menos dona de casa e mais como uma inquilina temporária tolerada por cortesia.
— Talvez desta vez possamos passar sem eles? — sugeriu timidamente, cortando a salada. — Vamos comemorar nós três, tranquilamente, em família.
Sergei nem levantou os olhos do jornal: — Anna, vamos lá…
Sempre comemoramos juntos. É família.
«Família», pensou Anna amargamente. Para ele, talvez.
Para ela, era um grupo de pessoas que consideravam seu apartamento como deles, sua geladeira como comum e ela própria como funcionária da casa.
Às duas da tarde, a campainha tocou. Larisa entrou primeiro, como sempre, alta e sem cerimônia.
Mulher de quarenta anos, cabelo tingido e hábito de falar alto, dirigiu-se imediatamente à geladeira.
— Oi, Sergei! — deu um beijo na bochecha do irmão e abriu a geladeira na hora.
— Nossa, mas está vazio! Anna, cadê o bolo? Achei que você tivesse preparado algo especial.
— O bolo está na caixa sobre a mesa — respondeu Anna com calma, continuando a distribuir a salada nos pratos.
— Comprado? — fez uma careta Larisa. — Anna, você tem mãos, podia ter feito você mesma.
Logo entrou Volodia, marido de Larisa — homem baixo, com entradas no cabelo e expressão constantemente insatisfeita.
Ele passou silenciosamente para a sala, olhou os móveis criticamente e sentou-se em uma poltrona.
— Sergei, quando vocês vão trocar o sofá? — gritou da sala. — Já afundou completamente. Não dá para sentar confortavelmente.
A tia Klava, mulher magra de cerca de sessenta anos, com queixo pontudo e observações igualmente afiadas, entrou por último.
Parecia sempre que tivesse sido convidada pessoalmente para “organizar” a vida alheia.
— Anna, querida, — observou a cozinha — por que a pia não brilha? E essas toalhas tão cinzentas… Uma mulher deve cuidar da casa, é sua imagem.
Anna cerrou os punhos, mas permaneceu em silêncio. Sergei colocou a mão em seu ombro por trás — gesto que deveria acalmar, mas que, por algum motivo, a irritava ainda mais.
— Mãe, tia Klava, sentem-se à mesa — disse com tom pacificador. — Anna se esforçou tanto, preparou tantas coisas.
À mesa começou o que Anna chamava mentalmente de «tribunal familiar». Larisa pegou a salada e imediatamente fez uma careta:
— Meio sem gosto. Anna, não economize no sal, os homens gostam mais salgado. E maionese pouca. Muito seco.
— Ontem eu disse a Sergei — acrescentou a tia Klava — que seria bom fazer umas reformas. O papel de parede está desbotado. E um casal jovem precisa pensar no futuro.
Anna comia em silêncio, tentando não ouvir os comentários. Mas quando serviram o prato quente — seu frango com molho cremoso — a tia Klava provou e fez uma careta:
— Estranho que te tenham casado com esses talentos culinários — disse em voz alta o que pensava. — O frango sem tempero, molho ralo. Na nossa época, meninas aprendiam a cozinhar desde cedo.
Larisa riu:
— Ah, tia Klava, pelo menos Anna é magrinha. Mas muito magra, parece doente, Anna. Melhor ganhar uns cinco-sete quilos. Senão parece doente, como se não houvesse dinheiro para comida de verdade.
Volodia largou o garfo e disse de repente:
— Entrei no banheiro — tem mofo nas juntas entre os azulejos. Anna, é preciso ficar de olho nessas coisas. Isso é insalubre. A dona da casa precisa notar.
Algo estalou na mente de Anna. Ela se levantou lentamente da mesa, sentindo uma onda reprimida por anos subir dentro de si. Sergei olhou surpreso:
— Anna, para onde você vai?
Ela olhou para os parentes reunidos — Larisa com sua risada insolente, Volodia com ar satisfeito de quem apontou um defeito, tia Klava com expressão permanentemente insatisfeita.
— Sabe de uma coisa? — sua voz estava calma, mas firme — basta. Acabou.
Ela foi até a porta e a escancarou.
— Não quero mais ver vocês aqui, vocês nem são meus parentes! — essa festa foi a gota d’água, e ela se obrigou a se fazer respeitar.
Um silêncio mortal pairou na sala. Larisa foi a primeira a se recompor:
— Anna, você enlouqueceu? Somos família!
— Família? — Anna riu, mas um riso amargo. — Família é quando se respeitam uns aos outros. Vocês vêm à minha casa há anos, comem minha comida, criticam cada detalhe e acham isso normal!
Sergei se levantou, olhando para a esposa, confuso:
— Anna, calma. Eles não fizeram por mal…
— Não por mal? — ela se virou para o marido, e ele viu em seus olhos algo que nunca tinha notado antes — cansaço, dor e determinação.
— Sergei, se agora você disser mais uma palavra em defesa deles, vá com seus parentes.
Eu sou a dona desta casa e não permitirei mais esse tratamento!
O marido abriu a boca, mas ao encontrar o olhar dela, fechou lentamente.
A tia Klava murmurou indignada:
— Como ousa! Nós somos mais velhas, mais experientes! Os jovens hoje em dia estão completamente ousados!
— Fora! — Anna estava diante da porta escancarada, sem desviar os olhos dos parentes. — Saíam imediatamente da minha casa!
Larisa se levantou, ofegante:
— Sergei, você não vai permitir…
— Sergei não permitirá nem proibirá nada — interrompeu Anna. — Porque não é decisão dele. Esta é minha casa, minha paciência acabou.
Os parentes começaram a se arrumar relutantemente. Volodia resmungava algo sobre «jovens bobas», tia Klava balançava a cabeça, e Larisa tentava explicar algo ao irmão. Mas Sergei permanecia em silêncio, olhando para a esposa.
Quando a porta se fechou atrás deles, o apartamento ficou surpreendentemente silencioso.
Anna se apoiou na porta com as costas e fechou os olhos.
— Anna… — começou Sergei.
— Não, agora me ouça — abriu os olhos e olhou para ele. — Tolero a grosseria deles há cinco anos.
Cinco anos ouvindo que sou uma má esposa, dona de casa, cozinheira.
Cinco anos permitindo que remexessem nos nossos armários, criticassem os móveis, a casa, minha aparência.
Sergei deu um passo incerto em sua direção:
— Eles não queriam te magoar. É só o jeito deles…
— É o jeito deles, e eu tenho meus limites — disse Anna firmemente.
— E se você quer que este casamento continue, precisa respeitar esses limites.
Ela foi para o quarto, começando a arrumar a mesa. As mãos tremiam pela tensão nervosa, mas dentro dela havia um alívio estranho — como se um enorme peso tivesse sido tirado de seus ombros.
— Não vou te impedir de vê-los — continuou enquanto empilhava os pratos. — Encontram-se onde quiserem, até todo dia. Mas nesta casa, ninguém mais vai me dizer como viver, o que cozinhar ou como parecer.
Sergei ajudava em silêncio. Várias vezes tentava falar e depois ficava calado.
No fim, parou segurando uma pilha de pratos:
— Anna… não percebia o quanto isso te pesava.
Ela olhou para ele:
— Percebia. Para você era mais fácil fingir que estava tudo bem do que lidar com o descontentamento deles.
Ele colocou os pratos na mesa e se aproximou dela:
— Me desculpe. Sério. Pensei que você simplesmente… não gostasse de barulho, confusão. Não imaginei que fosse uma questão de falta de respeito.
Anna parou, secou as mãos com um pano:
— Sergei, não serei a esposa perfeita segundo os padrões deles.
E não vou mais tolerar ofensas em silêncio na minha própria casa.
Se eles não conseguem me tratar como pessoa — então que não venham.
— E se… se eles pararem de falar comigo? — perguntou ele, incerto.
Anna deu de ombros:
— Essa será a escolha deles. Sua escolha é entre eles e eu.
Eles permaneceram na cozinha, entre as iguarias intactas da festa, e Sergei entendeu que era realmente uma escolha.
Não entre parentes e esposa, mas entre o hábito de evitar conflitos e a disposição de proteger quem se ama.
— Tudo bem — disse finalmente. — Eu vou falar com eles.
— Não falar — corrigiu Anna — você precisa explicar.
Explicar que eu não sou funcionária da casa, não sou objeto de crítica, nem tema de discussão. Sou sua esposa e mereço respeito.
Passaram-se duas semanas. Sergei de fato conversou com os parentes — longamente, com dificuldade, entre gritos e ressentimentos.
Larisa se ofendeu, tia Klava se indignou, Volodia chamou Anna de «mimada».
Mas Sergei, pela primeira vez em muito tempo, não tentou apaziguar todos nem acalmar a situação.
Ele estabeleceu regras claras: ou respeito pela esposa, ou nenhum contato.
As festas seguintes foram na casa de Larisa. Sergei foi sozinho, e Anna sentiu alívio — finalmente não era mais obrigada a participar dos rituais familiares onde era só uma intrusa.
Um mês depois, Larisa ligou. Sua voz estava surpreendentemente calma:
— Anna, posso ir? Só para conversar.
Quando a irmã do marido estava sentada na cozinha, mexendo a xícara de chá nervosamente, Anna percebeu que algo havia mudado.
Larisa não observava mais a casa criticamente, não comentava sobre a comida, não dava conselhos.
— Eu queria me desculpar — disse finalmente.
— Sergei me explicou… Não pensei que nós… que você enxergasse assim…
— Larisa — interrompeu suavemente Anna — não é como eu percebo as coisas.
É sobre como devemos tratar as pessoas.
A mulher assentiu:
— Posso… posso ir às vezes? Só para visitar, de maneira civilizada?
Anna sorriu — pela primeira vez sinceramente, conversando com a parente do marido:
— Claro que pode.
Desde então, as festas de família mudaram. Não porque Anna tivesse “vencido” uma guerra, mas porque aprendeu a defender seus limites.
Os parentes do marido não a viam mais como garantida, não faziam mais comentários invasivos.
A tia Klava ainda era crítica, mas agora guardava suas opiniões para si.
Volodia parou de apontar defeitos na casa. Larisa até começou a pedir receitas.
Anna entendeu uma verdade simples: o respeito não se ganha com submissão.
Só se pode exigir.
E quando finalmente exigiu, percebeu que as pessoas eram perfeitamente capazes de respeitar — simplesmente antes ninguém tinha exigido.
Sergei também mudou. Não tentava mais “apaziguar” as situações às custas da esposa, não pedia para ela «entender e perdoar».
Ele aprendeu a distinguir entre harmonia familiar e obrigação de tolerar.
E o relacionamento deles só se fortaleceu — desapareceu o ressentimento oculto, surgiram honestidade e apoio mútuo.
Aquele dia de festa, quando Anna finalmente disse «chega», não marcou o fim das relações familiares, mas um novo começo.
Um começo baseado no respeito, não no hábito de tolerar desrespeito. E foi muito melhor assim.







